Mais uma sexta-feira de Death e Black Metal em Belo Horizonte. O Mister Rock abriu pontualmente às 19h30 para os fãs que já aguardavam numa pequena fila. Ao longo da noite o público melhorou e chegou a ser razoável, porém Vltimas, Hate, Mortifer Rage e Chaos Synopsis mereciam casa cheia. A realização de shows do mesmo estilo em datas muito próximas faz o público escolher entre um e outro. Entretanto, Belo Horizonte é uma cidade importante no cenário do Metal Extremo e o público deveria comparecer em maior número.

Apesar de ainda haver poucas pessoas no interior do Mister Rock, o Chaos Synopsis subiu ao palco quando faltavam 10 minutos para as 20h e entregou uma apresentação de alto nível. O vocalista Jairo expressou por várias vezes a alegria de estar de volta a Belo Horizonte. Ele citou quando tocaram no tradicional festival Bestial Devastation há mais de 15 anos e elogiou a culinária mineira. Em especial o fígado com jiló, prato que representa tão bem o Mercado Central de BH; estamos falando de uma banda com 20 anos de estrada e que faz um som rápido e agressivo. A classificação Thrash/Death é perfeita, e a bateria tocada por Friggi Mad Beats mostra exatamente isso. Ele aplica uma velocidade frenética nas batidas e quebras de ritmo bem marcante. Um show f#da! Se eles forem na sua cidade, não deixe a oportunidade passar.

Findada a primeira atração, não demorou muito para o Mortifer Rage começar seu show. Outra banda com mais de duas décadas de estrada. Originais de Santa Luzia, cidade vizinha a Belo Horizonte, eles tocam um Death Metal brutal e poderoso. Na linha de frente Carlos Pira espanca seu baixo e urra versos cheios de críticas sociais e que atacam a hipocrisia religiosa. Eles lançaram, no ano passado, o álbum Plagues Requiem. Uma das músicas deste trabalho é “The Holocaust of Madness” que faz referência aos absurdos do Hospital Psiquiátrico Colônia, na cidade mineira de Barbacena. Foram várias décadas de extermínio de pessoas “indesejadas”, como bem descrito no livro de Daniela Arbex (Holocausto Brasileiro) e pelo vocalista Carlos no momento que anunciava a música.

Foram dois shows muito bons de abertura, mostra que underground está longe de ser sinônimo de amadorismo. Pelo contrário, são bandas altamente técnicas, muita energia ao vivo e músicas que passam mensagens relevantes da nossa realidade. Enquanto o palco era preparado para as bandas headliners, deu tempo de tomar um refri, comer alguma coisa e conferir as bancas com produtos das bandas. Tinha muito item interessante. Da parte do Vltimas tinham CDs autografado, camisetas e patches. O Hate, além disso, comercializava LPs, moletom e boné. O Mortifer Rage também vendia suas camisetas e CDs e o Chaos Synopsis camisetas, CDs e também LPs.

Quando todas as luzes se apagaram, as atenções se voltaram novamente para o palco. A única fonte de luz vinha da logo branca do Hate no telão ao fundo do palco. Esse cenário permaneceu assim durante pelo menos 10 minutos enquanto tocava nas caixas um som que ambientava o público para o que estava por vir. O primeiro a assumir o posto foi o baterista Nar-Sil (Daniel Rutkowski) que, de forma contínua, atacava seus tambores como quem prepara uma tropa para a guerra. Enquanto isso os demais integrantes assumiam também seus postos. Domin (Dominik Prykiel) na guitarra ficou do lado direito do palco e o baixista Tiermes (Tomasz Sadlak) do esquerdo, pois o centro do palco é de ATF Sinner (Adam Buszko) o único integrante original, remanescente desde 1991 até os dias de hoje.

O Hate faz turnê de lançamento do disco Bellum Regiis (2025), mas a abertura do show foi com a pesadíssima Sovereign Sanctity do álbum Auric Gates of Veles (2019). Erebos veio logo em seguida com riffs rápidos e grudentos, solo bem encaixado e uma bateria que varia entre blast beats e viradas alucinantes. Por pouco mais de uma hora, o Hate tocou o que eles produziram de melhor nos últimos 20 anos. A última passagem do Hate pela capital mineira tinha sido em 2009, no festival Setembro Negro, ao lado do Destroyer 666. No ano seguinte, eles lançariam o álbum Erebos (2010), material que elevou a banda a um patamar superior e que representa um marco na carreira deles. Tanto é que ouvimos no Mister Rock um repertório praticamente todo montado com músicas posteriores ao lançamento de Erebos.

Já as novidades do novo álbum foram Iphigenia e Bellum Regiis. Em postagem nas redes sociais, a banda sugeriu que tocaria duas músicas nunca tocadas antes do novo álbum, mas não eram elas, pois já vinham sendo tocadas pela Europa. Uma curiosidade é que o Hate não fixa o setlist no chão palco, eles memorizam a ordem de músicas e deu tudo certo. Foi um show com atmosfera sombria e o peso absurdo do sofisticado Death Metal trazido da Polônia.

Pontualmente, às 22h50 o palco estava preparado para o Vltimas fechar a noite. A expectativa para ouvir a inconfundível voz de David Vincent, lenda do Morbid Angel é sempre grande. Desde que lançou seu disco de estreia Something Wicked Marches In (2019), um show do Vltimas era muito aguardado e, em apenas duas datas agendadas no país, Belo Horizonte foi contemplada, além de São Paulo. 

Luzes apagadas e, exceto por David Vincent, todos os músicos estavam a postos iniciando a execução da música de abertura do show que também é faixa-título do segundo e mais recente álbum Epic. Vincent entra vestido com um figurino de fora-da-lei das trevas, como nos filmes de bang bang, mas todo preto com sobretudo e chapéu de cowboy. Todo esse visual e cenários de palco, criam um clima obscuro perfeito que combina com a sonoridade carregada do Vltimas. David Vincent tem ao seu lado o guitarrista norueguês Blasphemer (Rune Eriksen), com longa passagem pelo Mayhem e desde 1996 no Aura Noir, ele é outro membro fundador do Vltimas. Os demais integrantes do bando são Ype TWS na bateria, João Duarte é o segundo guitarrista e Pawel Jaroszewicz é o baixista. Diferente de como o conhecemos no Morbid Angel, David Vincent não toca baixo no Vltimas. Entre alguns intervalos, ele faz algum comentário a temática da próxima música. Em um desses momentos, ele anuncia a música Monolilith dizendo que tocaria uma música de amor e seguiu de forma como quem reflete em voz alta com as seguintes palavras: “Mas eu não amo nada. Eu não amo nem a mim mesmo. Oh! Mas eu amo essa linda e fatal criatura que é tão malvada. Juntem-se a mim às preces para a única: Monolilith!”.

O dono da poderosa voz do Vltimas também reverenciou a cidade por ser o berço do Sepultura e do Sarcófago. O repertório foi, como era de se esperar, uma seleção das melhores músicas dos dois álbuns da banda. Foi uma noite incrível no Mister Rock. Apenas elogios à estrutura de som e luz e também ao trabalho da produção que foi da Demoncratic Records e Caveira Velha por tudo correr de forma positiva e dentro dos horários previamente anunciados.


Setlist Hate: Sovereign Sanctity, Erebos, The Wolf Queen, Bellum Regiis, Valley of Darkness, Luminous Horizon, Rugia, Iphigenia, Wrists, Resurrection Machine, Hex

Setlist Vltimas: Epic, Praevalidus, Invictus, Mephisto Manifesto, Exercitus Irae, Last Ones Alive Win Nothing, Scorcher, Nature’s Fangs, Total Destroy, Monolilith, Miserere, Diabolus Est Sanguis, Something Wicked Marches In, Everlasting