O ano era 1958 e Miles Davis já era considerado um dos melhores músicos de Jazz do mundo. Com uma criatividade incessante e ideias desafiadoras. Mas não era ainda o seu auge, o que colocaria o seu nome eternamente na música.
Neste período Miles já tinha fechado contrato com a Columbia Records, lançando diversos LP’s que se tornariam icônicos com o passar dos anos. Mas faltava aquele que o definiria e deixaria a gravadora consagrada por conceber uma obra atemporal.
O que quero dizer é que “Kind of Blue” (59) é mais que um disco, mas um divisor de águas para um estilo, se tornando o álbum mais vendido da história do Jazz até hoje e reformulando a musicalidade “jazzística” com simplicidade e improviso, mas tudo isso regado a muita inspiração e obviamente técnica dos envolvidos.
Foram apenas dois dias de gravações – 02/03/59 e 22/04/59 – com Miles tendo apenas pequenos rascunhos de suas ideias, mas a ideia principal era ter os músicos em estúdio para criar a obra mediante aos seus comandos que iam nascendo conforme iriam tocando.
A exigência de Miles para Columbia para entregar um clássico – e sim, ele afirmava que este álbum mudaria a história do Jazz – foi: whisky e cocaína a vontade (e aí, pensa que foi assim mesmo? Ou é parte de um conto urbano em torno desta lenda imortal?!).
Sim, e a orientação aos músicos era: só vamos parar de tocar quando sairmos daqui com algum material. Intervalo para almoçar ou comer algo? Negativo, tocar até sair algo. Beber e cheirar? Ok, a vontade, mas dessas sessões nascerá um clássico.
Agora imagina para a gravadora ouvir essas condições e os músicos que entram em cena – e foram escolhidos a dedo por Miles – sabendo que, ou saímos daqui com um clássico pronto ou morremos de overdose. Tocar até desmaiar, chegar literalmente a miséria humana extrair o melhor de si nos momentos mais desesperadores da fome e sede!
Será mesmo que Davis tinha enlouquecido e não tinha nada sob controle? Parece um cenário assustador, não é? Mas o trompetista conduzia a todos discretamente e fazia a criatividade e improviso aflorar de todos os músicos ali presentes, mostrando que quando parece não ser possível é aí que devemos continuar.
Para essas gravações que o mesmo já considerava um clássico sem ao menos ter entrado em estúdio tivemos a apresentação ao mundo de outra lenda do Jazz, o saxofonista John Coltrane, que antes de “Kind of Blue” era considerado apenas um músico mediano e sem destaque (que ironia do destino né).
Completando as lacunas o time era de muito peso: o pianista Bill Evans, Jimmy Cobb na bateria, o baixista Paul Chambers os saxofonistas John Coltrane e Julian “Cannonball” Adderley e a lenda Miles Davis no trompete.
“Kind of Blue” é tão mágico, que ao vivo nunca teve uma reprodução aproximada do que fizeram em estúdio. Mesmo tendo um lado mais soft e fusion com certa simplicidade, as composições soam harmoniosas e ricas em detalhes e melodias, realmente sendo um momento único a sua audição e execução.
Presenteie seus ouvidos com este clássico e ouça o poder da persistência e perseverança em formato sonoro.