A Gutted Souls surgiu em 2004, a partir das cinzas da NECROPEDOPHILE, evoluindo do Gore/Splatter para um Death Metal com temáticas politizadas sobre psicopatia, manipulação midiática e corrupção da ciência e religião. Após estabilizar sua formação em 2010, com Iron e Wellington Ferrari, a banda lançou o EP Unconscious Automaton (2012) e o álbum The Illusion of Freedom (2017), aclamado pela crítica.
Desde então, destacaram-se em eventos como o Extreme Hate Festival e ao lado de nomes como Obituary e Krisiun. Em 2019, adotaram uma abordagem mais sombria com o single Organic Portal e atualmente trabalham no segundo álbum, Portals to Chaosium, marcando uma nova fase mais brutal e esotérica.
Agradecemos a disponibilidade de falar com O SubSolo e queria perguntar de início, o que levou à decisão de mudar os temas de suas letras de Gore/Splatter para questões sociais e políticas?
Gutted Souls: Salve! Quem te responde é Iron, vocalista e fundador da banda. Naqueles tempos, a banda era fortemente influenciada por Cannibal Corpse, Lividity, Gorgasm, bandas dessa linha lírica. Com o passar do tempo, outras temáticas como a do espaço sideral do Wormed, o misticismo oriental do Cynic, e a revolta política do Napalm Death começaram a ter maior influência em minhas letras. Foi um processo natural, que agora no novo álbum evoluiu mais uma vez.
Parar uma banda é sempre um pouco chato, acreditamos. Como foi o processo de encontrar os integrantes certos após a pausa na banda, e que desafios vocês enfrentaram nesse período?
Gutted Souls: A banda teve algumas mudanças de formação porque somos criteriosos com comprometimento. Especialmente em relação ao que o metal representa.
Muitas pessoas marcaram a banda durante esses anos. Gostaria de saber de que forma a colaboração entre Iron e Wellington Ferrari, influenciou a sonoridade e a direção criativa do GUTTED SOULS?
Gutted Souls: Wellington trouxe consigo muitas ideias únicas e especialmente vontade e paixão pelo Death Metal. O Illusion of Freedom é o ápice dessa colaboração. Ele tem um jeito de compor muito característico que fica bem marcado em faixas como Being Human e Authoritarian Follower.
Todo EP é trabalhado o pré, durante e pós. Quais foram as principais inspirações para o EP Unconscious Automaton e o álbum The Illusion of Freedom?
Gutted Souls: Suffocation certamente foi a principal, juntamente com Decapitated, para ambos os álbuns. Mas no EP queríamos ser velozes e selvagens. Um bocado de influências de Severe Torture e Origin naquela época. O resultado foi a alcunha de Brutal Death Metal, que nos persegue até hoje. No novo disco vai ser difícil de manter esse rótulo, estou curioso para ver como vão rotular. A real é que somos uma banda com elementos de tech, brutal, old school, tudo em uma grande sopa de metal da morte.
Mas saindo desta digressão e retornando ao tópico, o Illusion já foi um experimento em ser polido, buscar um som mais cristalino e claro, e com mais melodias do que no EP. Em termos líricos, os dois trabalhos tinham um elemento de protesto contra as atrocidades que ocorriam no cenário geopolítico. Sempre me interessou escrever sobre o que estava ocorrendo fora do Brasil, pois sinto que o Brasileiro tem um bocado de dificuldade de entender que o que ocorre na esfera geopolítica eventualmente reverbera aqui.
O Bolsonarismo por exemplo nada mais é do que a implementação tupiniquim das ideias de Bannon, o mentor da ascensão de Trump. Então nessa época eu senti necessidade de chamar a atenção para o conflito na Síria, na faixa Being Human por exemplo, e que todo movimento facista precisa de apoiadores autoritários, como em Authoritarian Follower. Authoritarian Follower e Snakes in Suits tem a marca de outro elemento bem presente na época: a literatura sobre psicopatia e outras caracteropatias quando manifestadas de forma não-violenta.
Todos conhecem a figura do psicopata serial killer, mas nem todos conhecem o psicopata CEO que não mata, mas exerce poder de outras formas. O Illusion é feito destes dois elementos.
Uma pessoa que sempre se molda a banda, é o produtor. Como foi a experiência de trabalhar com Rodrigo Oliveira no Dharma Studios, e que impacto isso teve no som do álbum?
Gutted Souls: No EP, nós mesmos produzimos, e pela falta de recursos fizemos tudo em casa. Até improvisamos um aquário pra gravar a voz usando colchões e papelão no antigo apartamento do Wellington. Quando o Rodrigo ofereceu a oportunidade de gravar naquele estúdio monstro que é o Dharma, ficamos numa mistura de êxtase com apreensão de como seria finalmente trabalhar junto a um produtor.
Foi uma experiência tão boa que estamos repetindo no disco novo. Ter o olhar de um produtor adicionando ou removendo elementos das suas faixas, dá uma roupagem nova para as músicas que não teríamos pensado sem ele.
Cada lançamento é sempre único e inicia uma história. O que a banda aprendeu com a recepção positiva da mídia especializada em relação a The Illusion of Freedom?
Gutted Souls: Descobrimos que tínhamos fãs! Fãs fiéis que até hoje seguem aguardando o próximo disco. Saber que sua música se conecta de maneira tão genuína com outro metalhead, é algo que não tem preço.
Outro aprendizado é ver que a mídia especializada como um todo quer ver as bandas crescerem e conquistando seus espaços.
O que motivou a mudança temática e sonora em Organic Portal, e como isso reflete a evolução da banda?
Gutted Souls: Organic Portal foi uma releitura de uma música da época dos tempos do Gore/Splatter, chamada The Necropedophile Reject. Fiz uma nova letra baseada nas redes de pedofilia cibernética e comecei a explorar uma ideia de arquétipos místicos, inspirada por Jung.
A ideia é que o pedófilo em questão é a representação arquetípica de um predador nefasto, que a cada ato ganha mais materialidade por assim dizer. Foi um prelúdio de ideias que são exploradas mais a fundo no novo disco; musicalmente foi um experimento em fazer um Death Metal sinistro e sombrio, essa ideia persiste em certas faixas no novo disco.
Que novas direções musicais e temáticas vocês estão explorando no próximo full length?
Gutted Souls: O novo full length: Portals to Chaosium, tem seu nome derivado de uma dimensão no universo de HP Lovecraft onde os desejos e pensamentos mais caóticos tomam forma corpórea. E se cada ato, cada estilo de vida for reflexo de um arquétipo místico em escala cósmica? Teríamos arquétipos benignos, neutros, predatórios. Todos refletidos em atitudes e estilos de vida. É uma continuação dos temas sociais abordados no Illusion, mas agora com uma nova camada de exploração.
Como a banda vê o papel do Death Metal como uma forma de crítica social e política na atualidade?
Gutted Souls: Desde a sua criação, o Death Metal sempre foi um grito ensurdecedor contra os absurdos do capitalismo terminal, e as amarras religiosas. O mero ato de tocar Heavy Metal já era a pura contracultura.
Desde então, o Death Metal se popularizou enquanto linguagem, e elementos foram usurpados por gente que acha que “é só música”, mas o Death Metal que pulsa no subterrâneo conhece os seus. Vejo uma retomada do Death Metal enquanto arte obscura, voltando as suas origens de se contrapor de maneira extrema e surreal aos absurdos da vida cotidiana anestesiada.
Agradeço novamente o tempo disponibilizado e queria deixar esse último espaço para uma mensagem para nossos leitores.
Gutted Souls: Obrigado por abrir o espaço para nós. Para quem está conhecendo a banda agora, entre no nosso canal no YouTube, ou conheça a banda pelo Bandcamp ou Spotify, e para quem já nos acompanha, vocês são a razão de seguirmos fazendo musica. Obrigado!