No dia 22 de agosto, o Tork’n Roll, em Curitiba, foi tomado por uma atmosfera fúnebre e ritualística. A noite marcou a passagem do Cradle of Filth, uma das instituições mais reverenciadas do Metal Extremo e que marcou a adolescência de muitos fãs, alguns deles, inclusive, guardaram camisetas de duas décadas atrás para lucir as já desgastadas prendas na ocasião.
A casa recebeu um público numeroso, ávido por presenciar o espetáculo de uma das formações mais icônicas do gênero. O setlist mesclou clássicos imortais da discografia com novas composições, mantendo a tradição da banda em alternar brutalidade e atmosferas sombrias. Dani Filth, com sua presença demoníaca, guiou a noite entre guturais dilacerantes e encenações teatrais.
A abertura ficou por conta dos norte-americanos do Uada, que acompanham o Cradle of Filth em toda a turnê. O quarteto de Black Metal entregou um show denso, hipnótico e envolto em completa escuridão, literalmente. A escolha estética da quase ausência de iluminação no palco foi tão marcante quanto polêmica, dificultando bastante o trabalho dos fotógrafos. O fato é que a performance da banda foi comentada intensamente, ainda assim, o clima sombrio e a atmosfera ritualística conquistaram os presentes, funcionando como uma preparação perfeita para a catarse que viria a seguir com os britânicos.
Em sua aguardada volta ao Brasil após sete anos de ausência, a banda trouxe consigo a turnê de divulgação de seu 14º álbum de estúdio, The Screaming of the Valkyries (Napalm Records, 2025), lançado em março, e entregou aos fãs uma performance que ficará registrada como um dos momentos mais intensos, e também melancólicos, da história recente do grupo.
Com um setlist construído para equilibrar: novidade e tradição. Canções recentes, como The Screaming of the Valkyries e Crown of Worms, mostraram o vigor da fase atual da banda: riffs com forte influência de Thrash Metal e Heavy Metal tradicional, combinados com arranjos sombrios que evocavam os anos de glória. Em contraste, clássicos como Her Ghost in the Fog, Nymphetamine (Fix) e Cruelty Brought Thee Orchids transformaram a casa em um coro coletivo.
O show foi acompanhado por uma produção visual cuidadosamente arquitetada. A iluminação em tons quentes criou uma aura cabulosa e conduziu o público por um cenário que parecia saído de uma ópera gótica. A presença da tecladista Zoe foi um dos pontos altos: suas linhas sinfônicas e atmosferas etéreas criaram pontes entre as músicas, reforçando o caráter quase cinematográfico da apresentação.
O que ninguém poderia prever naquela noite é que o show em Curitiba se transformaria, dias depois, em um símbolo de transição para o Cradle of Filth. Pouco após a passagem da turnê pelo Brasil, Zoe anunciou sua saída oficial do grupo. Em um comunicado, a tecladista revelou divergências profundas com a administração da banda e afirmou que a decisão já vinha sendo amadurecida há meses.
A revelação lançou uma nova luz sobre a apresentação curitibana. O destaque dado à sua performance, passou a ser encarado como uma espécie de despedida não planejada. Para muitos fãs, aquele show acabou se tornando uma das últimas oportunidades de vê-la no palco ao lado do Cradle, o que adiciona uma carga emocional retrospectiva ao evento.
No fim, o show no Tork’n Roll não foi apenas mais uma apresentação dentro de uma turnê internacional. Ele condensou o que o Cradle of Filth sempre representou: a fusão entre música extrema e teatralidade gótica, entre catarse e tragédia. A entrega de Dani Filth e companhia foi arrebatadora, mas o prenúncio da ruptura com Zoe deu ao espetáculo uma dimensão quase histórica.
Para os fãs curitibanos, a noite de 22 de agosto ficará guardada como uma experiência inesquecível: uma noite fundida nas trevas, mas que também marcou o fim de um ciclo dentro da própria banda e o presságio de mudanças profundas no futuro do Cradle of Filth.
Resenha por: Karla Sweden
Fotos por: Chris Alfredo
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