Originários da cidade de Cleveland (Ohio), os Dead Boys estão, sem dúvida alguma, entre os nomes mais relevantes e influentes da história do punk rock. Tendo feito parte da primeira geração do punk americano ao lado de outros nomes como os Ramones, Heartbreakers e Dictators, grupos que tiveram os seus dias mais gloriosos a partir da segunda metade dos anos 1970 e que compuseram um célebre cenário cultural em torno do clube noturno CBGB’s na cidade de Nova Iorque, os Dead Boys produziram pelo menos dois dos álbuns mais seminais do estilo: “Young Loud and Snotty” (1977) e “We Have Come For Your Children” (1978), ambos indispensáveis em qualquer coleção do gênero.
Como um fã declarado dos Dead Boys, tive o imensurável prazer de ter um rápido (mas objetivo!) bate-papo com o baixista Jeff Magnum que já esteve no Brasil em duas ocasiões em um período de menos de um ano. Confiram a entrevista a seguir.
Eu sei que essa é uma questão que você deve ter respondido muitas vezes, mas é necessário repeti-la para os fãs brasileiros: o que o Dead Boys significa na sua vida?
JEFF MAGNUM: Significa um monte para mim! Ao entrar na banda (eu toquei com eles em 1975 na nossa banda pré-Dead Boys chamada Frankenstein) eu saí de Cleveland, arrumei um emprego em uma loja de discos e me mudei para Nova York em maio de 1977. Eu sou muito orgulhoso da nossa contribuição para a cena “punk” nova-iorquina, e nossos shows eram magnificamente bons! Eu tentei arrancar o máximo dos baixistas punks minimalistas/despojados/básicos (Dee Dee Ramone era um mestre nisso e eu aprendi muito assistindo ele tocar milhares de vezes). Eu meio que queria emergir nesse estilo e adicionar meu próprio toque melódico. Eu acho que, no final, eu fui ok. E para creditá-los, os outros Dead Boys nunca reclamaram para mim sobre isso. Além disso tudo, eu conheci minha esposa Beth em uma de nossas gigs no CBGB em 1977 e a vida ficou bem legal!
Como era sua relação com os outros membros do Dead Boys?
JEFF MAGNUM: Nem sempre nos demos muito bem, mas a música (e nossos interesses em comum e senso de humor parecido) era o que me inspirava e foi o que nos manteve, apesar dos problemas de abusos de substâncias com alguns membros da banda que fariam eventualmente levar a banda a se separar. Além disso, foram tantas, tantas gigs que eu pensava que nós éramos a melhor banda do mundo naquele momento.
É difícil falar sobre Jeff Magnum e Dead Boys sem mencionar as bandas punks americanas do começo. Você poderia descrever suas impressões sobre aqueles tempos? Como era sua relação com os Ramones, por exemplo?
JEFF MAGNUM: Bem, os Ramones eram absolutamente os melhores. Eu os assisti muitas vezes no CBGB’s rugindo em seus sets e eles eram ótimos. No entanto, eu não me impressionava muito com várias bandas punks de NY entre 1977-’78. Eu gostava de The Dictators, Sic Fucks, Heartbreakers e alguns outros, mas a maioria delas eu achava enfadonhas.
Dead Boys – Cheetah Chrome, Jeff Magnum, Jimmy Zero, Johnny Blitz e Stiv Bators |
A que você tem dedicado a sua vida após o fim dos Dead Boys?
JEFF MAGNUM: Eu ainda amo escutar música e tocar baixo. Eu mesmo venho tentado dar aulas de baixo para alguns amigos. Minhas habilidades de “ensino” são muito básicas e bobas, mas acho que ajudou um pouco alguns jovens aspirantes à baixistas. Chamar isso de “ensinar” provavelmente é errado, está mais para sentar com eles e oferecer conselhos.
Em sua opinião, quais as vantagens e desvantagens de ser um punk nos tempos atuais? O que mudou desde que você era um punk rocker adolescente?
JEFF MAGNUM: Bem, tínhamos muito mais do que reclamar em 1977! Estou brincando. O mundo é um lugar diferente hoje. Eu não sei quais são as desvantagens de ser um punk atualmente. Tudo o que eu sei é que um monte de jovens americanos está nisso hoje em dia para obter “gratificação instantânea”. Eles acreditam que vão encontrar sucesso imediato sem saber fazer nada e eu acho isso uma merda.
A estrada sempre proporciona histórias impagáveis. Poderia nos contar algum episódio divertido pelo qual você já passou?
JEFF MAGNUM: Em novembro de 1977, nós estávamos em Los Angeles para alguns shows na Starwood. Nos ficamos hospedados no Tropicana Motor Inn em Santa Monica. Em uma noite onde o tédio passava dos limites, quatro de nós (eu, Cheetah e os roadies do Dead Boys – Beef Jerky e Fuji) decidimos que iríamos dar uma olhada inofensiva na casa de Sharon Tate, onde ocorreu todos aqueles terríveis assassinatos graças à Família Manson. Com algumas informações fornecidas pelos punks locais, nós colocamos algumas cervejas no carro alugado e nos dirigimos para 10050 Cielo Drive. Encontramos a maldita rua e finalmente o portão da casa, mas nós não ficaríamos por muito tempo. Dois pares de faróis em Porsches pretas surgiram do nada e nos cercaram. Um dos motoristas saiu, veio conversar com o nosso motorista, Beef Jerky, e perguntou: “O que vocês estão fazendo aqui?”, e Beef disse: “Uh, nós estamos perdidos.” “Vocês não são daqui”, foi a resposta severa que obtemos, “Por favor, manobre o seu carro e saiam daqui.” Nós não tivemos chance de discutir com aqueles caras, então nós fizemos o que foi dito. Uma Porsche foi na frente e a outra atrás, nos escoltando até a saída. Obviamente, eles eram seguranças contratados para manter malucos como nós fora de lá.
Os Dead Boys com Seymour Stein (proprietário da Sire Records), Hilly Kristal (dono do CBGB’s) e amigos |
Para Jeff Magnum, o que é essencial em um bom show de punk rock?
JEFF MAGNUM: Provavelmente uma boa banda, que toque muito alto, com uma performance cheia de atitude e energia. E o mais importante: um público que os acompanhe nessa!
O que não pode faltar na sua playlist?
JEFF MAGNUM: Eu escuto muita coisa velha que você provavelmente nunca ouviu na sua vida. Eu cresci em uma época (final dos anos 60) onde havia um monte de ótimos baixistas e eu realmente acho que fui influenciado por todos, de alguma maneira! Eu colocava um disco e só escutava o baixo. Várias e várias vezes até aprender a tocar a parte que eu gostava. Você precisa se lembrar que naqueles tempos primitivos não havia TV à cabo, canais de filmes ou internet, então eu mesmo me ensinei a tocar baixo. Era bastante divertido para mim.
Tem alguma banda atual que você goste? Se sim, qual e porquê?
JEFF MAGNUM: Eu não sou o público-alvo para o que é o “punk” atualmente. Amigos estão sempre me sugerindo novas bandas e álbuns que eu preciso ir ver e escutar, e quando eu faço isso, eu geralmente fico desapontado. Não há nenhuma criatividade ou melodia. Não tem baixistas jovens que eu escute hoje em dia, e eu sinto falta disso. A última banda nova que eu escutei e gostei provavelmente foi a Young People With Faces, e isso foi há anos atrás.
Você já esteve no Brasil algumas vezes. O que mais gosta daqui? E o que não pode deixar de fazer quando pisa em solo brasileiro?
JEFF MAGNUM: Eu não consigo acreditar que Beth e eu estivemos em São Paulo duas vezes em menos de um ano! Nós conhecemos tantos amigos legais que amamos e apreciamos! Nessa visita mais recente, em setembro, fiz um esforço consciente para conhecer o máximo de música brasileira que fosse possível. Nossos amigos de SP nos ajudaram e forneceram um monte de músicas gravadas. Eu escutei todas! Eu queria meio que sentir um pouco da sua música de raiz. Me aprofundei nisso de uma forma que você não imagina!
Jeff, deixo esse espaço em aberto para você complementar como quiser. Muito obrigado pela oportunidade!
JEFF MAGNUM: Obrigado, Moa! Eu vou usar esse espaço para falar isso. 2016 tem sido um ano importante na minha vida. Por causa das nossas duas visitas à São Paulo em menos de um ano, eu tenho conhecido um monte de pessoas realmente legais e inteligentes, e eu quero mencioná-los porque isso realmente afetou minha vida positivamente. Jonas e Rayssa Alves, Kay Bators e Lucas Carvalho, Aline Santos, Marcelo Liebhardt, Marilia Aby, Leticia Souto, Amanda Turra, Mauro Cintra, Ana Clara Fiori, Ana Carolina Alves, Flavio Fernandes, José Julio do Espirito Santo, Binho Silva e Deborah Moreira. Muito obrigado por me deixarem entrar em suas vidas, eu amo todos vocês!
Jeff Magnum 2016 |
The Dead Boys |
Jeff Magnum & Johnny Blitz – Cleveland/1978 |
Jeff Magnum w/ Kay Bators and Lucas Carvalho – Sao Paulo/2015 |