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Entrevista: Sad Theory (Curitiba/PR)

O Sad Theory é uma das bandas mais experientes de Curitiba, Paraná. São mais de 20 anos de atividades, com seis álbuns de estúdio. Um número impressionante dentro do underground nacional. A banda está divulgando o single Canis Metallicus, do vindouro álbum Léxico Reflexivo Umbral, que terá temas inspirados na série do Netflix, Black Mirror.

A gente bateu um papo com os membros para falar sobre o grupo, censura e segunda guerra mundial. A formação é Daniel Franco (baixo), Aly Fioren (guitarra), Claudio ‘Guga’ Rovel (vocal) e Jeff Verdani (bateria).

Como surgiu a banda e qual o conceito no nome Sad Theory?
Daniel: A banda surgiu em 1998, e nessa formação inicial, além do Guga, estavam os agora ex-membros Juan Viacava, Carlos Machado e Gabriel Molinari. O Carlos e o Juan eram os responsáveis, naquela época, pelas temáticas e conteúdos líricos, e foram eles que batizaram a banda dessa maneira. Não sei dizer qual a motivação deles para esse nome, mas eu, desde que entrei na banda em 2015, interpreto o espírito da coisa como uma exortação a retratar, através de uma linguagem artística, por vezes pitoresca, aquilo que geralmente buscamos esconder, evitar ou negar, seja em nós mesmos, nos nossos entes queridos ou até mesmo em nossa sociedade, ou seja, a “teoria triste” a respeito das coisas. Aquilo que há de feio, incômodo, vergonhoso, odioso, pessimista, melancólico ou inaceitável dentro de nós e ao nosso redor é a nossa munição artística.

Como foi o retorno da banda após alguns anos de hiato, com o disco Descrítica Patológica? Vocês enxergam uma mudança no som nessas duas fases distintas?
Aly Fioren: Na verdade, o “Descrítica” foi gravado em 2009, e só em 2012 voltamos a conversar sobre a burocracia para o lançamento do disco, mas sem a possibilidade da banda estar com integrantes originais, devido a uma série de eventos. Em 2014, procurei o Guga para discutir um possível retorno, e o resultado foi o “Vérmina Audioclastia Póstuma”. Eu compus as músicas, gravei todos os instrumentos de cordas e escrevi a bateria em formato midi, nesse tempo de produção eu estava produzindo o projeto “Rotpeter” encabeçado pelo Daniel Franco (hoje nosso atual baixista e letrista), Daniel escreveu as letras do Vérmina e consequentemente entrou para a banda. Para o lançamento, convidamos o Jeff Verdani e o Wenttor Collete, que mais tarde viriam a ser integrantes oficiais, e já participariam da produção do álbum posterior “Entropia Humana Final”.

Quanto a mudanças no som, já tínhamos quatro discos quando ocorreu a separação, a essa altura já estávamos com uma sonoridade original, um estilo próprio de forma evolutiva. É claro que a entrada de 3 novos integrantes modifica algumas nuances, tanto na parte instrumental quanto lírica, e isso somado à experiência minha e do Guga, faz com que a obra se atualize, mas sem deixar tudo o que foi construído para trás, o saudosismo alinhado ao presente é um potente artefato nos dias atuais.

Vocês lançaram um lyric vídeo para a música “Canis Metallicus”, como surgiu a inspiração para a letra? Tem ligação com a série Black Mirror, certo?
Daniel: Todas as letras que foram compostas para o álbum foram inspiradas em maior ou menor grau em algum episódio da Black Mirror. Os episódios que escolhemos tratam – descrevendo muito simplificadamente – do que há de pior no ser humano e na sociedade, trazido à tona por facilidades tecnológicas. Por vezes, a relação de uma letra com algum episódio específico se dá de maneira parcial ou abstrata, com apenas um ou outro conceito sendo trazido para a letra. Em outras há uma maior fidelidade com o roteiro. Não há uma regra geral.

No caso da “Canis Metallicus”, a inspiração é o episódio “Metalhead”, em que os personagens tentam sobreviver num mundo pós-apocalíptico, onde são caçados por “cães robóticos” altamente avançados. Diferentemente do roteiro do episódio, a letra explora uma possível causa do apocalipse, quando as máquinas, uma vez avançadas até o ponto da senciência, apercebem-se de que seus criadores humanos são uma ameaça ao progresso e não são mais necessários, decidindo, conjuntamente, aniquilar a espécie toda.

Está no plano da banda lançar o novo álbum de estúdio para 2021? Ou vão sair mais alguns singles?
Jeff: O novo álbum está em processo final de mixagem e com certeza sairá este ano, logo iremos apresentar a capa do material, tracklist, e iniciar uma pré-venda. Ainda assim teremos alguns singles em lyric video.

O nome do próximo disco é Léxico Reflexivo Umbral. Qual o significado? E por que a banda adotou este padrão de ter sempre três palavras nos nomes de seus álbuns mais recentes?
Daniel: Fica mais fácil de entender se respondermos a última pergunta por primeiro. O álbum de 2015, “Vérmina Audioclastia Póstuma”, foi batizado assim pelo Athos Maia, colaborador da banda de longa data, que sempre esteve presente e já contribuiu com muitas letras nos álbuns anteriores. Tal nome acabou sendo um indicador, ainda que velado e misterioso, da direção lírica do álbum. Tudo ali remete às ideias de decaimento, morte e decomposição, justamente o que acontece no desenrolar do conceito.

No álbum seguinte, “Entropia Humana Final”, temos como temática o esgotamento das relações humanas, manifestado em diversos massacres que ocorreram, tanto em tempos de guerra como de paz, no século XX. O conceito de entropia final vem da termodinâmica e representa, de maneira muito resumida, um estado onde todos os processos já ocorreram, não há mais energia livre para se realizar trabalho e o Universo chegou à sua “morte térmica”, tornando-se um imenso campo homogêneo e inerte. Essa ideia foi metaforizada e trazida para o campo das relações humanas, simbolizando que os eventos descritos no álbum são um ponto terminal e irreversível na história da humanidade.

Já o vindouro “Léxico Reflexivo Umbral” tem mais de um significado. Um deles é uma referência direta à série Black Mirror, uma vez que “reflexivo” pode ser aquilo que reflete a luz como um espelho, “umbral” remete à escuridão e “léxico” é um conjunto de ensinamentos. Então, nessa primeira interpretação o título significa algo como o “compêndio do espelho negro”, ou seja, um amontoado de episódios da Black Mirror. Mas há outros sentidos nas palavras do título. Por exemplo, “reflexivo” pode ser aquele que faz reflexões, que pensa, rumina. E “umbral” além de escuridão pode conotar uma ideia de passagem, de transição. Inclusive o espiritismo usa esse termo como uma amálgama desses dois significados: o Umbral é um lugar escuro e de certa forma tenebroso, e é um ponto de transição, de expurgo e de passagem para outra realidade. Assim, outra interpretação do título seria uma “transição através de um conjunto de reflexões”, sem necessariamente entrar no mérito de essas transições serem para melhor ou para pior. Entretanto, em face à conotação de escuridão que “Umbral” pode ter, podem sim ser para pior.

Assim, a utilização desses títulos trinomiais não é exatamente um padrão adotado, algo que virou uma regra, mas um modo de aprofundarmos a simbologia de cada um dos álbuns.

Recentemente um videoclipe da banda foi censurado no YouTube. Sobre o que se trata a música e como vocês enfrentaram esta situação?
Daniel: Trata-se da “Punhais Longos, Cortes Profundos”, do “Entropia Humana Final”. A música conta um episódio ocorrido em 1934, na Alemanha Nazista. Numa disputa interna, Hitler ordenou a execução de toda a cúpula da SA de Ernst Röhm para consolidar o seu poder sobre a nação. Foi uma sinalização precoce dos horrores que estavam por vir nos anos seguintes. Fizemos um lyric vídeo dela, contendo imagens de Hitler, de Rohm e de paradas militares nazistas, todas retiradas de documentários históricos do próprio YouTube. A plataforma retirou o vídeo do ar, alegando que continha discurso de ódio, sem dar maiores explicações, o que é um verdadeiro disparate. Recorremos, detalhando todo o significado da obra, que se tratava de uma denúncia e não uma ode ao 3° Reich. De nada adiantou, e o vídeo segue fora do ar no YouTube. Lamentamos, mas felizmente ainda é possível assisti-lo no Facebook.

O Sad Theory lançou um vídeo ao vivo, gravado no Maniacs Metal Meeting. Como surgiu a ideia de lançar um material ao vivo? Este show sairá em algum formato físico?
Jeff: Aproveitamos a oportunidade de captar este show, um dos poucos que fizemos e ainda com uma ótima estrutura, gostamos do material e aproveitamos para lançar ao menos nas plataformas digitais. A opção física ficou inviável, ainda em conjunto com o novo álbum de estúdio. Mas ainda pode acontecer no futuro ou aparecer alguma faixa como bônus no disco novo.

Conheça o trabalho do Sad Theory:
Facebook: https://www.facebook.com/sadtheory
Instagram: https://www.instagram.com/sadtheory_br

Ouça:
Spotify: https://open.spotify.com/artist/4I8eTlO2lkCWfNtRmp47KX
iTunes: https://music.apple.com/br/artist/sad-theory/1110507945
Deezer: https://www.deezer.com/br/artist/11728751
Bandcamp: https://sadtheory.bandcamp.com

O jornalista Clovis Roman trabalha há mais de duas décadas na área cultural, na cobertura de shows, entrevistas e resenhas de discos, e atua como assessor de imprensa. Clovis é colecionador de CDs e em sua mesa na redação do Acesso Music sempre há uma caneca de café morno. ;)