“Mais Angra que o Angra”.

É isso que muitos vinham dizendo ao longo dos debates a respeito da turnê Rebirth of Shadows, promovida por Edu Falaschi, acompanhado pelo baterista Aquiles Priester, para celebrarem os clássicos da estadia de ambos no Angra. Esta, que chegou ao fim da segunda perna da turnê  neste domingo, com um show extraordinário em São Paulo, também contou com um time de impor respeito. Além dos já mencionados, estavam nos trinta palcos dessa tour Fábio Laguna, tecladista que acompanhou o Angra nas turnês entre 2001 e 2007 e participou do EP Hunters and Prey e do álbum Aurora Consurgens, a dupla do Almah Diogo Mafra e Raphael Dafras (guitarrista e baixista, respectivamente) e Roberto Barros (conceituado guitarrista da cena Metal de nosso país). Com essa escalação, muitos começaram a espalhar a mencionada frase, comparando o Angra atual, que possui apenas Rafael Bittencourt como membro original, além de Felipe Andreoli, remanescente da formação de 2001, com essa formação da turnê, com dois membros das gravações entre 2001 e 2006 e um músico que tocava junto à banda nos shows. Quem é mais Angra, afinal? 



Deixando este tópico para depois, vamos a Florianópolis, onde muitos podiam jurar que seria uma furada: show numa noite de tempestades, em plena terça-feira. Quem seriam os loucos que iriam se dispor a perder horas de sono e chegar “virado” no seu trabalho no dia seguinte? Lhe respondo que foram muitos. Próximo as 23h40, “In Excelsis”, faixa instrumental que marca o início do disco Rebirth, começou a ser reproduzida na aparelhagem sonora da casa. Como de costume, foi seguida da clássica “Nova Era”. No entanto, se para o público tudo estava bem, para o vocalista dono da festa não estava. Aproveitando algumas brechas de instrumentais durante a música, Edu mandou recados para o responsável pelo som da casa que seu retorno no palco estava ruim. A reclamação persistiu após o término da música e ainda no meio de “Acid Rain”. Falaschi chegou a dizer, ao fim da segunda faixa apresentada, que persistindo o retorno naquela qualidade seria inviável prosseguir com o show. Após muita dialogação do vocalista com o técnico de som, e com o publico no meio, o vocalista considerou que o retorno enfim havia sido ajustado de forma aceitável para seguir com a apresentação. Espectadores diante disso tudo, a platéia reagiu em apoio ao vocalista ao longo da conversa, que enfim se direcionou aos presentes para agradece-los pela presença e anunciar a execução de uma faixa que o Angra nunca havia tocado ao vivo: “Eyes of Christ”. Seria mais uma prova de que a banda ali presente era “mais Angra que o Angra”?





O destaque da noite veio com “Late Redemption”. A música por si só já é de arrepiar, mas com o pedido de Edu Falaschi para o público ficar responsável pelas partes cantadas pelo grande Milton Nascimento, ela se tornou realmente emocionante. Ver todo o público entoando os versos cantados em português foi memorável e por si só pagou a noite. Momentos como este, na verdade, foram rotineiros no show, que contou com um público que sabia o valor daqueles instantes. Reparei no rosto de muitas pessoas a fixação pelo ícone que Edu Falaschi representa, vi expressões de emoção e felicidade ao longo do show. Vi pessoas que, assim como eu, não hesitaram em cantar cada música e aproveitar cada segundo que tivemos para sentir como se estivéssemos de volta em alguma turnê de 2004 ou 2005.


Isso se dá ao calor do momento, à magia em volta das músicas apresentadas. Ver “Running Alone” e “The Shadow Hunter” ao vivo com Edu Falaschi as interpretando, ao lado da banda espetacular que ele tinha, são coisas que levamos para sempre em nossas vidas. Obviamente, são canções que exigem muito do vocal, e alguns sabem o quanto Edu se preparou para estes shows, o quanto ele trabalhou em preservar sua voz e poder apresentar o melhor que sua voz atual pode mostrar. Ainda assim, os sinais do refluxo, que tanto danificou seu vocal ao longo dos anos sem o devido tratamento, ainda estão lá. Em dados momentos, ocorrem deslizes, mas em outros, o vocalista mostra que ainda tem longos e impressionantes alcances vocais. É indubitável, no entanto, que em todos ele emociona. Seja ao interpretar as furiosas “Temple of Hate” ou “Spread Your Fire”, ou ao trazer as baladas “Heroes of Sand” e “Rebirth”, Edu se entrega por completo em cada execução, e o público entende e vive estes momentos como devem ser vividos.

A banda que compôs os shows desta turnê é merecedora de todos os elogios. Aquiles Priester dispensa apresentações, é simplesmente, como Falaschi o apresentou, “o maior baterista de Power Metal do mundo”. Fábio Laguna é uma figura que muitos não conhecem, mas quem prestou atenção no homem por trás dos teclados, ali, no canto do palco, viu que ele é peça fundamental para a excelência nas apresentações. As guitarras que tanto chamam atenção nas crias de Kiko Loureiro e Rafael Bittencourt são conduzidas por uma dupla que enche os olhos: enquanto Diogo Mafra, que era da casa, nascido na Ilha da Magia, mostrava uma energia e explosão contagiante em palco, misturando expressões faciais e corporais que encarnavam cada música com uma habilidade vistosa na guitarra, seu companheiro de seis cordas Roberto Barros é mais contido, na dele, mas chamando muita atenção mesmo assim, pois contém sua agitação em suas mãos, que reproduzem, como ele gosta de dizer, “nota por nota” (e ele não mente, realmente, cada nota original, de cada riff ou solo, estão lá, ao vivo, bem na sua frente). Como baixista, sei das dificuldades que um baixista passa para tocar músicas do Angra, então toda minha admiração fica com Raphael Dafras, que é dono de uma habilidade impressionante em cima das seis cordas de seu instrumento e mostra maestria nos graves exigentes das composições de Felipe Andreolli. Todos são músicos impressionantes e perfeccionistas, que executam em palco com uma fidelidade inacreditável aquilo que nossos ouvidos já tanto escutaram ao longo dos anos nos álbuns.

Com “Gate XIII” ao fundo, após a triunfante apresentação de “Spread Your Fire”, a instrumental que encerra a obra Temple of Shadows era o sinal de que o espetáculo havia alcançado seu fim. Foram quase duas horas de show, e cada minuto nele valeu a pena. Valeu a pena a viagem até a capital catarinense, valeu a pena enfrentar toda a chuva e transtornos causados por ela e sim, valeu a pena ir totalmente virado para o trabalho depois. Não nego, Edu Falaschi é meu ídolo na música, não só por simplesmente ter gravado meus álbuns favoritos, mas por sua história de superação após seu pior momento e por ter superado coisas que teriam feito muitos desistirem. Essa turnê é para aqueles que sabem o valor disso e sabem que o Angra está em cada um que passou pela história da banda, inclusive em nós. Então, é mais Angra que o Angra? Não, o Angra é uma banda enorme e que merece respeito, e a maor prova desse respeito é que Rebirth of Shadows é um pedaço do Angra que quer prestar tributo à essa fase que sem dúvidas foi marcante para o Heavy Metal nacional.


“Glorious, don’t be afraid to lead the way with thy sword. You are the chosen one. Go, spread your fire!”
Onde há espaço para escrever, tenha certeza que irei deixar minhas palavras. Foi assim que me tornei letrista, escritor e roteirista, ainda transformando minha paixão por música em uma atividade para a vida. Nos palcos, sou baixista da Dark New Farm, e fora deles, redator graduado em Publicidade e Propaganda para o que surgir pela frente.