O SubSolo teve a honra de entrevistar Edu Lane, baterista e único membro remanescente da banda NervoChaos, que é mundialmente conhecida por seu Death Metal. Em 2016, NervoChaos completou 20 anos de carreira, tendo rodado o mundo inteiro com suas turnês. Durante o festival United Bands, na cidade de Lages (SC), trocamos uma ideia com o Edu, onde ele relatou muitos detalhes sobre a história da banda, o novo disco e as viagens mundo a fora. Vem com O SubSolo e entre no mundo do NervoChaos!



Foto: Leandro Cherutti


Olá Edu! Primeiramente
nós d’O SubSolo parabenizamos o NervoChaos pelos 20 anos de carreira. Nesses
anos de estrada a banda conquistou muito público e viajou o mundo, porém, também
passou por momentos complicados. Quais os principais
fatores responsáveis por manter duas décadas de banda?

Edu Lane: Eu acho que o essencial
para qualquer coisa que você faz na vida é amar aquilo que você faz, porque só
assim é possível superar todas as dificuldades e seguir em frente naquilo que
acredita. A banda é algo assim para mim. Eu nunca parei para pensar muito em quantos
anos a gente está na estrada. Obviamente que quando completamos 20 anos, todo
mundo comentava a respeito, e aí quando parei para pensar, olhei para trás e
pensei ‘caramba, já passaram 20 anos!’. Mas não é algo que diariamente a gente
fica pensando. Para manter a banda, é só com amor à causa. Não tem segredo.
Para qualquer coisa na vida, se você ama aquilo que você faz, com certeza vai lutar
com todas as forças e não vai ter tempo ruim. A gente enfrenta as dificuldades.



NervoChaos passou por
muitas mudanças de formação durante a carreira. Em algum momento vocês ficaram
receosos quanto à aceitação do público ou de os fãs se tornarem inseguros sobre
o trabalho de vocês?

Edu Lane: Toda mudança de
formação é algo complicado. No meu caso, por ser o único membro original
remanescente na banda, não é algo que eu desejo que aconteça, mas muitas vezes
é necessário acontecer para a banda se manter ativa, isso acontece para o bem
da banda. Eu penso sempre em um bem comum e não só na minha pessoa. É claro que
qualquer mudança gera uma certa insegurança nas pessoas, principalmente quando
se trata de posições chave, como mudar um vocalista. Às vezes as pessoas
perguntam o que vai acontecer com a banda e com a nossa sonoridade. Mas eu acho
que com o tempo
a gente vem mostrando que, apesar de todas essas mudanças, nós não mudamos nossa proposta inicial, não mudamos o número de RG da banda. A
banda tem que ter uma identidade e isso permanece inalterado. Obviamente houve
uma evolução sonora, a banda vem buscando evoluir, buscando sua sonoridade
própria. Cada integrante novo traz sua bagagem, traz um tempero novo para a
banda, mas eu procuro sempre manter o NervoChaos na proposta inicial, para não
perdermos a identidade. Quero fazer um som onde as pessoas reconheçam que é NervoChaos.
Temos sete discos de estúdio e se você analisar do primeiro ao mais recente,
você vai ver que é a mesma banda, mas ela está mais madura e talvez mais
confortável aos processos de composição, mas a essência continua lá. A galera
que nos acompanha e gosta da gente acho que já percebeu isso, que independente
de mudança de formação, NervoChaos se mantém com a proposta intacta, seguindo  em frente.


Recentemente vocês
gravaram o sétimo álbum, intitulado “Nyctophilia”. Esse novo trabalho foi gravado
na Itália, no Alpha Ômega Studio, junto ao produtor Alex Azzali, que já havia
trabalhado com a banda anteriormente. Como foi a escolha de gravar no exterior e qual a
diferença entre gravar no Brasil e gravar fora?

Edu Lane: Todos os discos, com
exceção desse último, a gente gravou no Brasil. Nós sempre procuramos mudar de
estúdio, buscar novos ares para não cair naquelas fórmulas que muitas bandas
utilizam. Sempre quisemos nossa sonoridade própria. A cada disco vínhamos
mudando. No disco “To The Death” (2012) fomos gravar no Rio de Janeiro e
mandamos pro produtor Alex Azzali, para ele mixar o nosso trabalho. Então a gente gravou no Rio, enviou
pra ele e ele mixou na Itália e nós gostamos do trabalho dele, então resolvemos
no disco seguinte “The Art of Vengeance” (2014), trazer o Alex pro Brasil. Fomos novamente pro Rio de Janeiro, mas dessa vez em outro estúdio. O Alex fez
toda a gravação e a produção, mas ele levou o material para mixar e masterizar
fora. Dessa forma nós sentimos que o passo natural para o “Nyctophilia” (2017)
era justamente ir ao estúdio do Alex em vez de trazer ele pro Brasil. Assim
experimentamos novos ares, achamos que foi legal porque sempre tivemos aquele
sonho de gravar fora do Brasil, então quando surgiu oportunidade de ir pra
Europa, nós fomos. Terminamos uma turnê que estávamos fazendo na Europa junto
com o
Incantation e então já ficamos lá para gravar o disco. Ficamos um mês na
Itália, na cidade de Como, foi legal porque ficou só a banda com o Alex, então
pudemos trabalhar nas músicas, na produção, demos uma lapidada final e fizemos
a gravação usando as armas dele, em vez de trazer ele para usar outras armas. Eu
acho que a gente acertou.
Não foi uma questão de menosprezar o produto que é feito
no Brasil, pelo contrário, temos o maior orgulho de todos os discos gravados
aqui, onde tem bons produtores e bons estúdios
, mas dessa vez quisemos
experimentar algo novo.



Vocês têm agenda lotada no Brasil e no mundo. Como
foi trabalhar com uma nova formação, fazendo uma sequência ininterrupta de
shows?

Edu Lane: Houve um ano em que foi
tudo muito louco mesmo. Em 2015 a banda sofreu quatro mudanças de formação
durante o ano e durante a tour
, mas a gente conseguiu de alguma forma não parar,
não deixar a peteca cair e continuar na estrada. É claro que isso não deu
margem para trabalharmos em material novo, até por isso o “Nyctophilia” demorou
um pouco mais pra sair, queríamos ter lançado em 2016, mas acabou saindo só
agora em 2017. Após as saídas e entradas de membros, em 2016 nós já estávamos
com uma formação estruturada, a banda toda renovada, então usamos o ano de 2016
para trabalhar no material novo, fizemos alguns shows para dar uma entrosada
nessa formação, gravamos o disco no meio do ano e permanecemos fazendo shows no
ano de 2016, mas promovendo o lançamento anterior. Agora em 2017 já começamos
acelerando, desde janeiro viemos fazendo shows. Fizemos quatro shows pelo
Brasil no início do ano, depois em março partimos para uma turnê latino-americana,
junto com o pessoal do Krisiun, onde fizemos desde o Uruguai até o México, com
exceção do Brasil. O lançamento do disco foi em abril. Já em maio nós partimos
para a Ásia, novamente com o Krisiun. 
Esse pacote NervoChaos e Krisiun,
nós quisemos fazer este ano porque comemoramos 20 anos da nossa
primeira turnê, que foi junto com o Krisiun, então pensamos justamente em unir
as duas bandas e fazer algo bacana. Agora estamos em turnê pelo Brasil, onde
faremos nossa maior turnê brasileira até então, serão 65 shows pelos Brasil em
10 semanas
. Já estamos na terceira semana da tour. Após essa turnê brasileira,
seguiremos para turnê europeia que inicia em setembro e termina no final de
novembro. Em dezembro ainda não sabemos, talvez a gente faça alguns shows aqui
no Brasil para encerrar o ano. Este ano está sendo muito importante pra gente,
porque completa um ano dessa formação, comemora o lançamento do nosso sétimo
disco e a gente deve bater uma marca de uns 180 shows ou mais no ano, o que
para nós é muito bacana, realmente muito importante.









Recentemente NervoChaos tocou com grandes bandas, que certamente foram influências para vocês.
Qual  o sentimento de tocar com gigantes
do Metal?

Edu Lane: Se lá no início alguém
me falasse que um dia eu faria isso, eu não ia acreditar. É a realização de um
sonho, poder dividir o palco e poder se tornar amigo desses ícones, dessas
pessoas que inspiram a gente. Por exemplo, fizemos uma turnê ano passado com o
pessoal do
Venom INC, com o Mantas, Abaddon… e foi graças ao Abaddon que eu comecei a tocar bateria
em 1986. Para mim foi muito louco estar dividindo um ônibus com eles, fazer 20
shows juntos e aprender com os mestres. É algo meio surreal quando a gente
para pra pensar. Lá no Hammersonic encontramos com o pessoal do
Abbath,
Entombed e trocamos uma ideia… isso é bem mágico, é resultado das oportunidades
que a banda vem nos oferecendo. Na verdade eu não tenho nem palavras para
expressar meu sentimento.



Como vocês viajam o
mundo inteiro, certamente já tiveram diferentes tipos de recepções, observaram
diferentes comportamentos e culturas. Recentemente aconteceu aquele episódio
onde vocês foram barrados no aeroporto em Bangladesh. Como vocês lidam com tudo
isso? Tem alguns países que recebem vocês melhor e outros nem tanto? Já havia
ocorrido algum atrito por cultura ou religião em ocasiões anteriores?
Edu Lane: Eu tenho uma visão que
headbanger é headbanger em qualquer lugar do mundo, independente da sua
cultura, do seu sexo, da sua condição social.
Os comportamentos são muito
similares, mas é necessário entender algumas diferenças básicas. Por exemplo,
na minha visão, o público europeu costuma ser um público que agita um pouco
menos do que a gente está acostumado aqui, mas também eles têm oportunidade de
acompanhar a cena muito mais de perto do que a gente. Eu não acho que um é
melhor que o outro, só são formas diferentes que as pessoas têm de curtir. A
gente sempre foi muito bem recebido, mas ultimamente o mundo vem vivendo um
momento um pouco delicado, na minha opinião. Tanto em questão religiosa, com a
ditadura religiosa que vem assolando o mundo, seja o Islã, seja o Cristianismo,
quanto em problemas sociais que a gente enfrenta não só no Brasil, mas na
Europa, com vários países em crise. Os Estados Unidos também enfrentou uma
grande crise. Todos esses são fatores que muitas vezes impossibilitam as
pessoas de estarem comparecendo e apoiando, até por uma questão financeira.
Como nosso trabalho é entretenimento, a gente não é um produto de maior
necessidade em um caso de crise. Nós já havíamos feito turnê na Ásia em 2016,
tocamos na África, em diversos lugares e nunca tivemos nenhum tipo de problema
. Acho que o preconceito existe e nós vivemos isso diariamente, seja no Brasil
ou no exterior, mas a gente consegue lidar com isso. O que aconteceu em
Bangladesh com a gente, foi algo que nem imaginávamos que ainda existia, uma
ditadura, uma repressão, um preconceito tão latente e tão forte.
Por um lado
acho que foi bobeada nossa, por não termos investigado melhor sobre o país, mas
ao mesmo tempo a gente tem o costume de tocar foram, tínhamos vistos emitidos, o
produtor pagou as passagens, pagou o cachê, a gente viu o público comprando
ingresso, então tivemos todos os sinais positivos dizendo que estava tudo
certo. Quando iniciamos a turnê asiática fizemos Singapura, depois fomos para
Jacarta e quando estávamos voando de Jacarta para Bangladesh, o ministro de
Bangladesh cancelou o evento e deu uma ordem de prisão para os músicos caso
eles aparecessem, mas nós não sabíamos disso porque estávamos voando para lá.
Quando chegamos, por volta de 1 hora da manhã no aeroporto, fomos retidos pelas
autoridades locais, tivemos passaportes confiscados, ficamos em torno de 12
horas retidos no aeroporto em uma salinha, sem grandes explicações.
Resolvemos
acionar o consulado brasileiro do Itamarati e eles fizeram um trabalho
magnífico, tiraram a gente do aeroporto, nos levaram para um hotel, dormimos
lá uma noite. O hotel era protegido pelo exército. A ditadura lá é enorme, se
você pesquisar um pouco sobre o país vai perceber que nossas vidas estavam em
risco. Graças ao Itamarati nós conseguimos sair de lá. Esse acontecimento nos
fez refletir sobre uma série de coisas que muitas vezes esquecemos no nosso dia
a dia, pequenas coisas que possuem grande valor, como a liberdade. Apesar de
todos os problemas que temos no Brasil, podemos vestir a roupa que queremos,
podemos escolher ir a um show, podemos ouvir a música que preferimos, podemos
seguir a religião que quisermos. Então essas são coisas que nós temos e que
talvez se tornam tão corriqueiras que a gente acaba esquecendo ou não dando
devido valor. Bangladesh para nós foi um choque tão grande que nos fez refletir
e rever muitas coisas. Ficamos chateados com a falta de liberdade que aquelas
pessoas vivem. Também ficamos muito comovidos com o vídeo que fizeram, onde os
fãs se juntaram e pediram desculpas, falaram que estavam envergonhados pelo
acontecido.
Acho que foi um acontecimento mundial que movimentou muita coisa,
entrou na imprensa não só no Brasil mas na Europa, nos Estados Unidos, saiu na
BBC. Dessa forma eu espero que traga um sopro de liberdade para esse pessoal de
lá. Nessa ocasião nós acabamos cancelando os shows em outros lugares que
iríamos na turnê asiática, pois havia um risco similar. Achamos que já
tínhamos abusado muito da sorte e optamos pelo cancelamento dos shows na
Mongólia e China. Depois disso seguimos pro Japão, fizemos show lá, também
tocamos na Coreia do Sul e agora estamos de volta ao Brasil.


Além da cena no
exterior, com certeza vocês vivenciaram muito da cena no Brasil. Tendo
experiência nesse meio, o que você tem notado da cena underground brasileira?
Como anda? Quais foram as mudanças nos últimos tempos?
Edu Lane: Eu acho que a cena
brasileira vem evoluindo muito. Creio que a internet ajudou bastante, essa
globalização ajudou bastante, mas acho que as pessoas também não podem se
perder nisso ou só se basear nisso. Acho que isso é uma ferramenta magnífica,
essencial atualmente. A internet mudou a música de figura, facilitou muitas
coisas, mas no meu ponto de vista, trouxe algumas coisas negativas. As pessoas
não dão mais o devido valor às coisas, tudo é muito descartável, tudo é um
pouco superficial. Mas o lado positivo é que você tem acesso a equipamentos, acesso
a informações, pode trocar ideias com outras bandas. Penso que a cena
brasileira de música extrema, não só do Metal, mas também Hardcore e Punk, vem
crescendo.
O Brasil é um dos maiores berços culturais do mundo, não deve nada a
lugar nenhum
. Nós que começamos em 1996, nunca imaginávamos fazer um turnê no
Brasil e hoje a turnê que estamos fazendo é justamente para trazer um pouco da
cultura que vemos lá fora, onde se toca todos os dias, onde os shows durante a
semana são mais cedo, mas são importantes porque mantém a banda viva, fortalecem
a cena local. Por exemplo aqui hoje, é uma quarta-feira e talvez um espaço como
esse estaria fechado, mas
se as pessoas começarem a valorizar o espaço que tem
na sua cidade, vai ser bom para a cena no geral, não só para nós, mas para
bandas locais, para os donos das casas, para os produtores e para o público
local
. Isso é uma cultura que demora um tempo para ser assimilada, porém tenho
visto cada vez mais bandas brasileiras fazendo turnês pelo Brasil e eu acho que
estamos no caminho certo. Só reclamar é fácil, a gente é que faz a cena, então
precisamos arregaçar as mangas, entender os nossos problemas e fazer disso aqui
um lugar melhor pra nós mesmos.


Edu, nós agradecemos imensamente por essa entrevista. Para
nós é uma grande honra! Para encerrar, você gostaria de deixar um recadinho aos
leitores d’ O SubSolo?

Edu Lane: Primeiramente quero agradecer muito
pelo espaço e pela oportunidade de fazer essa entrevista com vocês. Recebi as
Coletâneas O SubSolo, não ouvi ainda, mas vou ouvir. Estão de parabéns pela
iniciativa, por fazer esse coletivo. Eu sei que não é fácil, mas vocês podem
sempre contar com a gente e vice-versa, estamos nessa por paixão e não por
modismo
. Vocês têm a essência do verdadeiro underground. Continuem mantendo
forte esse trabalho bonito que vêm fazendo. Força, gente! Compareçam aos shows,
apoiem as mídias alternativas como O SubSolo e muito obrigado! Vejo vocês na
estrada em breve! 






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