Salve Headbangers!

Esse ano o Ratos de Porão lançou o excelente Necropolítica, registro esse, que dividiu a opinião de muitos ouvintes de música extrema, não pela qualidade do trabalho, que eu defendo como um dos melhores do Ratos, mas principalmente, pela abordagem que o trabalho vem trazendo, letras ácidas que buscam na atual historiografia do Brasil sua fonte de inspiração.

Porém, ledo engano de quem acha que isso é uma novidade no trabalho do Ratos de Porão, basta conferir por exemplo, o álbum Brasil que é um clássico, seja do Punk, Hardcore, Crossover. Mas hoje, quero falar de um som que esta em outro álbum, que não é tão bem visto por alguns fãs, mas para mim é um dos mais brutos e faz jus ao seu nome, Cada Dia Mais Sujo e Agressivo e a porrada na nossa cara chamada Plano Furado.

Quem viveu o Brasil na década de 80, deve se lembrar do plano cruzado, ou como era conhecido na linguagem econômica, Plano de Estabilização Econômica, anunciado em 28 de fevereiro de 1986, no governo do presidente José Sarney (1985-1990). E aparentemente ele deu certo, mas o efeito bolha estava se criando, e não demorou um ano para que um dos principais vilões do Brasil desse sua cara, a Inflação.

Uma das medidas mais radicais, era a troca da moeda. O Cruzado veio em substituição ao Cruzeiro, uma moeda, em teoria, mais forte na casa de 1 por mil. Ou seja, cada mil cruzeiros equivalia a um cruzado, em tese, uma moeda forte iria controlar a inflação. Outra medida, foi o congelamento de preços sendo o povo um agente fiscalizador e a conversão para os salários em cruzados.

Na teoria, a população estaria ganhando mais. Com os preços congelados e uma moeda forte, seria o fim da inflação, que nessa época, batia casa do 517%. Porém, nove meses depois do nascimento do plano, a inflação registrou se na casa do 300% levando a dúvida, o que teria dado errado?

Aqui rapidamente um adendo: o conceito de inflação a qual me refiro, é o aumento contínuo e sistemático dos preços dos bens e serviços da economia, isto é, a moeda perde o seu valor pois, com a mesma quantidade de moeda, obtém-se ao longo do tempo uma menor quantidade de bens e serviço aquela sensação de a cada dia estar conseguindo comprar menos no mercado…

Na verdade de maneira bem resumida, o plano cruzado não levou em conta a politica fiscal do país, mais principalmente, o nosso alto déficit público, não era vantajoso para empresas privadas manter os preços congelados ,e logo por tabela, isso aumentou as dívidas públicas, ou seja, o governo teve que pagar as contas, então temos o maior problema para conseguir controlar os gastos, o Banco Central precisa agir, e isso gera uma inflação inercial respondida com emissão de moeda que é respondida com desvalorização e por tabela inflação.

Outra falha foi em relação a poupança. A ideia era que com a taxa de juros elevada e a moeda forte ocorressem mais investimentos na poupança, mas o que aconteceu foi justamente o contrário, ocorreram saques aproveitando a política do congelamento e logo a procura foi maior que a oferta levando a alguns casos a escassez, a medida que os produtores não tinham mais interesse em produzir já que os preços estavam congelados.

Com toda essa bola de neve, estava claro que o plano foi realmente furado, após as eleições de 15 de novembro de 1986, o PEE fracassou definitivamente e a inflação retornaria com mais força do que no período que antecedeu ao Plano Cruzado.

Em 1987, devido à crise econômica desenfreada, o Brasil decreta a moratória da dívida externa. Mesmo assim, o Cruzado continuaria como moeda nacional até janeiro de 1989, quando foi substituído pelo Cruzado Novo. O que inspirou o Ratos a escrever plano furado 2 no álbum Brasil, mas então é assunto para uma outra coluna.

Cada dia mais Sujo e Agressivo de 1987 é o terceiro álbum dos Ratos de Porão e o primeiro trabalho lançado pelo selo da Cogumelo Records, vindo direto de uma indicação de Max Cavalera, e como disse no começo do texto, eu tenho esse como um top 3 da carreira do Ratos. A pegada Crossover Thrash Metal está bem na cara até mesmo pelo título auto explicativo. Aliado a isso, uma grande dose de sarcasmo e críticas sociais. Além da faixa citada aqui, confira também: Morte e Desespero que tem participação do Max e um solo do Andreas Kisser. O mesmo álbum tem uma versão em inglês, mas eu prefiro esse que apresenta os Ratos atirando contra tudo e todos, e essa raiva está de volta com Necropolítica.



Plano Furado

Planejaram febrilmente, o Brasil ia mudar
Congelaram a pátria pra botar as coisas no lugar
Todo mundo, o mundo inteiro essa farsa engoliu

O povo se fudeu e o Brasil faliu!
Deu tudo errado!
Plano furado!
Deu tudo errado!

Eles não fraquejaram, prometeram que iam ver
Uma desculpa nova e o plano refazer
Refizeram a constituinte com um grande bacanal
Não rifaram o Brasil porque era ilegal!

Deu tudo errado!
Plano furado!
Deu tudo errado!

Pediram para igreja gentilmente ajudar
Cobrando entrada na missa que os fiéis possam pagar
O Papa interveio, disse logo: “Filhos meus
O plano é de vocês, mas o dinheiro é de Deus”

Planejaram febrilmente, o Brasil ia mudar
Congelaram a pátria pra botar as coisas no lugar
Todo mundo, o mundo inteiro essa farsa engoliu

O povo se fudeu e o Brasil faliu!
Deu tudo errado!
Plano furado!

Deu tudo errado!
Plano furado!
Deu tudo errado!


 

Paulista e um dos maiores amantes do Metal Extremo, principalmente se tratando do nacional. Professor de Geografia e História, é também formado em Matemática e Filosofia, Pai da Naylla e do Dhemyan. Foi colaborador de algumas mídias, antes de fundar o site Underground Extremo, o qual tem um laço de irmandade com O SubSolo. Acompanhava o trabalho d'O SubSolo a alguns anos e passou a contribuir e fazer parte da equipe, a qual é honrado em colaborar com o desenvolvimento desta grande mídia do Rock/Metal, sendo o responsável pela parte das escritas mais extremas do site.