Em mais uma parceria com o Som do Darma, trago o que possa vir a ser meu último texto do ano (ou o primeiro, dependendo de quando ele sair, ou mesmo, quando você estiver lendo).

Advindo da cidade de Sorocaba, interior de São Paulo, o The Giant Void é um projeto idealizado em 2021 pelo guitarrista e produtor Felipe Colenci, que ainda conta  com Hugo Rafael, vocalista e um dos finalistas do programa The Voice (2021). Na bateria completando o time está o alemão Michael Ehré, membro do Gamma Ray e Primal Fear.

E demonstrando todo o poderio que a banda tem a oferecer, o primeiro disco não tardou a chegar. Assim, em 28 de outubro de 2021 saía Thought Insertion, trabalho que foi muito bem recebido pelas principais mídias e figurões especializados no cenário musical, além de ter sido indicado na categoria “Melhor disco de Heavy Metal” na edição 2022 do prêmio Dinamite.

Muitos poderiam imaginar, que com tamanha receptividade, a banda trabalharia o repertório deste primeiro petardo , ao mesmo tempo em que, colheria os bons frutos do registro. Mas, pelo contrário, o trio decidiu aproveitar os bons ventos e adentrou novamente ao estúdio para gravar o disco alvo desta resenha.

Então sem mais delongas, adentremos nas águas densas de Abyssal…

Tudo se inicia de forma bastante cativante com os riffs pesados e galopantes de Dirty Sinner, uma faixa que emana as raízes do Heavy Metal tradicional, porém, sem abrir mão da mixagem modernosa que permeará o decorrer da audição. A letra trata de um indivíduo preso em um canto trôpego da própria mente, cujo os mais sórdidos pensamentos de um pecador sujo se fazem constantes. Os vocais emanam a força e virilidade a lá Ronnie James Dio, conseguindo fazer coro cativo com o instrumental, tornando essa faixa de abertura,um memorável petardo.

Na sequência, Ashen Empires Pt.2 (Nwo) apresenta um elemento que será constante no decorrer do trabalho: a presença de distintas camadas sonoras, que tornam ao menos esta obra do grupo em algo quase progressivo. O início é lúgubre ambientado pela beleza de um dedilhado e alternâncias mais melódicas e suaves nos vocais. Mas é em questão de poucos segundos que a pancadaria surge de forma imponente, revelando ao ouvinte uma espécie de professia sobre o futuro da humanidade e a instauração de uma nova ordem mundial, regida por um império de cinzas.

The Key possuí uma energia única abordando a nossa pequeneza perante os feitos do universo, e como o medo é a chave para controlar todo e qualquer tipo de sociedade. Faixa riquíssima!

Sem pisar no freio, Monster Within é uma verdadeira amostra de como o Heavy Metal pode sim soar de forma mais grudenta (ou até mesmo Pop), sem perder a brutalidade e o peso inerentes ao gênero. A tônica da composição traz à tona os maleficios e o sofrimento causados pelos sentimentos ruins que vamos acumulando no decorrer do cotidiano, alimentando um monstro interno, pronto para nos consumir.

No maior estilo Sabaton, The Black Pit é um épico que aborda os eventos da Batalha do Atlântico, confronto marítmo considerado a mais longa campanha militar da Segunda Guerra Mundial.

O espírito clássico do Heavy Metal volta a emanar aliado à modernidade do tema de Mars, que traz os vilumbres e expectativas da humanidade com as descobertas e os pequenos avanços do contato com o misterioso planeta vermelho.

Inner Truth é uma faixa motivacional, do tipo ideal para uma corrida ou treino na academia, que convida o ouvinte a refletir mais sobre os próprios valores e a própria capacidade de ser o protagonista absoluto na sua própria história.

Voltando a abordagem bélica, a cadenciada War Heroes  conta a história de Danilo Marques Moura, Segundo Tenente da Reserva que lutou na Segunda Guerra Mundial pelo 1º Grupo de Aviação de Caça da FAB. Aqui o The Giant Void além das variações sonoras, agora alterna entre o inglês e trechos em italiano. Destaque para o rápido solo de guitarra que por algum motivo me remeteu a algo de Era Um Garoto Que Como Eu Amava os Beatles e os Rolling Stones na versão dos Engenheiros do Hawaii.

Chosen One é o mais próximo que a banda chega em todo o álbum de flertar com elementos do Power Metal, trazendo até mesmo a temática do guerreiro escolhido pelos deuses para aniquilar todo o mal que assola o mundo, evocando em alguns meandros, algo remetente ao Viper nos primórdios.

Dimensions Collide considero como a faixa mais pesada da audição, com riffs que fazem o pescoço naturalmente sacolejar, além da filosofica temática por trás da letra, que traz o seguinte questionamento: Se você pudesse encarar a si próprio, ou mesmo, se houvesse a possibilidade de existir um clone semelhança física e moral fossem idênticas a sua, você sentiria orgulho ou teria receio de olhá-lo nos olhos?

Ashen Empires Pt.1 (Rising Empire) traz uma prequela à temática encontrada na segunda faixa de Abyssal, onde toda a destruição profetizada pela segunda parte, terá início quando formos incapazes de abandonar a tecnologia ao redor e, principalmente, quando começarmos a aceitar e obedecer qualquer mandamento, seja ele de quem for, sem exitar ou mesmo questionar…

E o disco se encerra de forma riquíssima com Human Downfall. Aqui a banda eleva toda a diversidade sonora a enésima potência, em uma faixa onde a mera pecha de “progressiva” seria no mínimo rasa. Ouça e se delicie com cada uma das inúmeras camadas que essa epopeia sonora proporciona, e chegará aos últimos segundos do álbum com aquela sensação incrível de satisfação…

Lançado oficialmente em 25 de outubro de 2023, Abyssal, assim como em Thought Insertion (2021) foi produzido pelo próprio Felipe Colenci.A arte da capa intriga pelos aspectos que muito remetem ao horror existêncial e cósmico de H.P Lovecraft, sendo uma colaboração coletiva entre João Vicentim, João Schendel e John Rendering. Já arte do encarte da versão física do álbum em O CD fora produzida por João Duarte.

O The Giant Void aproveitou a oportunidade que teve de abrir o show do icônico baterista do Black Sabbath e Dio, Vinny Appice, de passagem por Sorocaba, para oficializar o lançamento deste segundo registro.

Abyssal é um trabalho que não se prende a estruturas tradicionais de composição, sempre apresentando uma pequena nova faceta sonora  em cada trecho de cada faixa, dando aquela sensação de não saber o que esperar no que virá a seguir. Uma atitude bastante corajosa da banda, uma vez que o público do Heavy Metal em 90% dos casos, principalmente no Brasil, calca-se no mais do mesmo.

A mixagem é para lá de competente, dando vazão a cada detalhe minuciosamente adicionado às dozes faixas que compõem o disco, porém, pode soar modernosa demais para ouvidos adeptos de sonoridades mais cruas, densas e cavernosas.

Em suma, Abyssal é a prova de que o The Giant Void ainda tem muito o que dizer e muito mais ainda a se explorar em termos de sonoros. Se a banda continuar a investir nessa riqueza sonora apresentada até então, cada novo registro que se seguirá ,será sempre uma porta aberta para um universo vasto, farto, cujo ineditismo, reinará como um fator predominante para aqueles que por ele adentrar.

Tracklist
1-Dirty Sinner
2-Ashen Empires Pt.2 (Nwo)
3-The Key
4- Monster Within
5-The Black Pit
6-Mars
7-Inner Truth

8-War Heroes
9-Chosen One
10-Dimensions Collide
11-Ashen Empires Pt.1 (Rising Empire)
12-Human Downfall

Nascido no interior de São Paulo, jornalista e antigo vocalista da Sacramentia. Autor do livro O Teatro Mágico - O Tudo É Uma Coisa Só. Fanático por biografias,colecionismo e Palmeiras.