Embora uma figura polêmica dentro do cenário do Death Metal, Chris Barnes ex-Cannibal Corpse e hoje frontman do Six Feet Under, fora uma influência tardia dentro do estilo vocal que exerci na Sacramentia. Precisamente, no meu segundo e último registro dentro da banda, o IX, onde tentei acrescentar vocais guturais mais graves no estilo do vocalista.

O Six Feet Under certamente está entre as minhas bandas favoritas, mas reconheço que a banda deixou um gosto pra lá de amargo com Nightmares of The Decomposed, lançado em 2020. Uma pena, se levarmos em consideração que o grupo vinha de um ótimo disco anterior, o groovado Torment (2017) e também por ser o primeiro registro a contar com o antigo companheiro dos tempos de Cannibal Corpse, o guitarrista Jack Owen.

Apesar de algumas músicas “legaizinhas” como Zodiac e Blood of The Zombie, o registro soa primário, beirando quase ao amadorismo, como se a banda estivesse sendo forçada a lançar algo, e o pior, com os vocais de Barnes muito, mas muito distantes, dos que um dia gravaram clássicos como o Haunted (1995) e Maximum Violence (1999).

E realmente, depois de um fiasco desse tipo, somado a algumas declarações infelizes, pra não dizer ridículas do cantor, cheguei a pensar que o Six Feet Under teria chegado ao fim.

Mas para o meu espanto, em 2024, precisamente, no dia 13 de março, fui surpreendido com a chegada tímida de um novo single e o anúncio de um novo registro, Killing For Revenge, que dissecarei nos parágrafos a seguir.

Know – Nothing Ingrate fora justamente o primeiro single do álbum. E agora consigo entender o motivo da faixa ser a escolhida para   abrir o trabalho. Primeiro por uma questão cronológica, pois segundo a banda afirma, ela fora uma das composições primordiais para o novo petardo. E segundo, pela música ser uma verdadeira voadora no peito (ou orelhas?) do ouvinte.

A letra é uma ode aos inúmeros imbecis que se escondem atrás das telas na segurança do lar, e destilam ódio internet à fora. O refrão dessa pedrada é uma verdadeira martelada traulitante!

Mantendo a mesma dinâmica mais cadenciada com momentos em pausa, Accomplice For Evil Deeds, soa como um convite para o ouvinte testemunhar todos os atos escabrosos que a banda narrará no decorrer do álbum. Destaque para o hipnótico solo de guitarra que a faixa possui.

Vale destacar, que a parte lírica do disco conta pequenas histórias de vingança (daí o título), sejam elas partindo de ações humanas, ou mesmo da própria natureza.

E é justamente em Ascension, que vemos a própria terra lutando para expurgar todos os corpos de vítimas escondidos por décadas a fio. A terceira faixa carrega mais velocidade e um ar de desespero caótico, e junto da letra, soa como um agourento presságio. Quando a música está em seu ponto mor de efervescência, somos interrompidos de súbito assim como de um estado de transe com um sonoro “Die!”, que põe fim à canção.

O sentimento caótico ainda atormenta o ouvinte nos riffs hipodérmicos de When the Moon Goes Down in Blood. Aqui senti um ponta do Tomb of The Mutilated (1986) na questão lírica. Um sádico assassino sai em disparada pronto para caçar e executar uma provável vítima, deleitando-se tanto da crueldade e mutilação, quanto anestesiando-se animalescamente, copulando com o que restou do pobre cadáver. Tudo isso tendo como testemunha a rubra lua no céu.

A cadência volta com a arrastada Hostility Against Mankind, que apresenta um ótimo trabalho e sintonia entre baixo e bateria. Uma voz sádica conspira para o ouvinte, solicitando um pacto de morte e suicídio, tentando o  convencer de realizar as maiores atrocidades contra o próximo e, assim que o máximo de sangue for derramado, dar cabo da propria existência.

Na sequência, a enérgica Compulsive mostra o drama de um paciente de um sanatório, cujo o autocanibalismo, fora o fator que o levou a tal condição.

Fit of Carnage é uma das faixas perfeitas para iniciar um mosh. Os riffs aqui são mordazes  e contrastam perfeitamente com momentos mais lentos que desembocam em mais pura pancadaria sonora.

Neanderthal traz novamente uma climatização mais arrastada, que remete a algo que poderia estar inserido perfeitamente no excelente Maximum Carnage (1999). No solo da
música ,o Six Feet Under contou a participação de Jason Suecof, que além de guitarrista, já prozudiu trabalhos de bandas como Triviun, The Black Dahlia Murder e Death Angel.

Uma verdadeira porrada violenta e rápida é o que te aguarda em Judgement Day. Neste fatídico evento, todos os monstros da humanidade tem um desfecho merecido de acordo com o pecado cometido. Essa sem dúvida é uma das musicas mais velozes de todo o disco e com certeza, uma das melhores.

Não se deixe enganar pelo inicio mais cadenciado de Bestial Savagery, pois logo a atmosfera se transforma em mais uma música caótica, que simboliza a ira da natureza contra a raça que há anos a moleta e explora inconscientemente.

O controle mental dos poderosos sobre o povo é a tônica de Mass Casualty Murdercide, uma quase homenagem ao clássico do terror, Videodrome.

As pitadas do Warpath (1997)  são perceptíveis em todo horror da guerra, narrado de forma nua, crua e cruel por Spoils of War.

Encerrando o disco com Temple of The Dog do Nazareth, o Six Feet Under dá continuidade a uma tradição de releituras de clássicos de grandes bandas, que renderam ao grupo quase uma discografia à parte com a série de álbuns Graveyard Classics.

Lançado oficialmente em 10 de maio deste ano, via Metal Blade, o processo de gravação de Killing For Revenge seguiu os moldes pandêmicos, tendo cada linha gravada à distancia por cada integrante. Junto a Barnes estão presentes parceiros de longa como o baixista Jeff Hughell, o baterista Marco Pitruzzella e acompanhando Jack, o guitarrista Ray Suhy.

A produção, assim como 90% das letras do disco foram assinadas por Owen, que também foi responsável pelo disco anterior (e que bom que houve evolução).

Já a arte da capa, uma “belíssima” espécie de árvore, cujos frutos, são nada mais, nada menos, que cabeças humanas, é obra de Vince Locke, o icônico ilustrador americano por trás das igualmente icônicas e grotescas capas dos clássicos do Cannibal Corpse.

Além do digital, o disco se encontra disponível no formato LP e em CD.

Posso dizer, ao final da audição que o 14° registro de inéditas do Six Feet Under é infinitamente melhor ao antecessor, tirando um pouco daquele amargo “dipirônico” deixado por Nightmares of The Decomposed.

Os vocais de Barnes melhoraram consideravelmente, talvez pela sobriedade de dois anos do vocalista sem alcool e a ervinha muito louca. Mas a sensação que tive em alguns momentos, é que as linhas de voz pareceram mais baixas e até um tanto quanto escondidas dentro da mixagem do álbum, cujo instrumental parece estar alguns niveis mais altos.

Em suma, o segundo fruto da parceria Owen e Burns traz um retrogosto, e até mesmo em alguns momentos, um certo zeitgeist do Cannibal Corpse, mas com uma energia nova e singular, sendo estes dois últimos fatores importantíssimos e o que o Six Feet Under necessitava. Aguardo ansioso para ver o que essa dupla ainda pode oferecer em lançamentos futuros…

Tracklist
1 – Know-Nothing Ingrate
2 – Accomplice to Evil Deeds
3 – Ascension
4 – When the Moon Goes Down in Blood
5 – Hostility Against Mankind
6 – Compulsive
7- Fit of Carnage
8 – Neanderthal (convidado – guitar solo- Jason Suecof)
9 -Judgement Day
10 – Bestial Savagery
11 – Mass Casualty Murdercide
12 – Spoils of War
13 – Hair Of The Dog (Cover do Nazareth)

 

Nascido no interior de São Paulo, jornalista e antigo vocalista da Sacramentia. Autor do livro O Teatro Mágico - O Tudo É Uma Coisa Só. Fanático por biografias,colecionismo e Palmeiras.