Hail Marcelo Vasco, é inenarrável o prazer de estar fazendo essa entrevista. Para começar queria agradecer o seu tempo e dedicação, iniciando as perguntas queria saber sobre como foi seu contato inicial com o Heavy Metal e se você lembra a primeira capa que te chamou a atenção
Marcelo Vasco: O prazer é todo meu! Obrigado pelo interesse no meu trabalho! Bom, meu primeiro contato com o Heavy Metal começou cedo, meados dos anos 80 e eu estava na quarta série no colégio, lembro como se fosse ontem (risos). Eu sempre gostei bastante de desenhar monstros, alienígenas e coisas do tipo. Um belo dia um amigo me levou uma fita cassete do irmão mais velho, já sabendo que eu adorava monstros, e pediu pra eu desenhar aquele monstro que tinha na capa pra ele. O monstro era ninguém menos que o icônico Eddie, do disco “Killers”, do Iron Maiden. Eu fiquei apavorado e ao mesmo tempo vidrado naquela imagem. Então ele me emprestou a fita pra eu levar pra casa e preparar o desenho. Obviamente, curioso como sou, resolvi colocar pra tocar a música… E o resultado, como já era de se esperar, foi amor a primeira ouvida (risos). O contexto visual impactante da capa aliado à aquela música, que pra mim era algo completamente novo e diferente, gerou um mix de sentimentos na minha cabeça. A partir dali a coisa nunca mais foi a mesma! Minha vida mudou! Ela não só foi a primeira capa que me chamou atenção, como também foi a responsável por me introduzir no mundo do Heavy Metal.
Se não me engano o primeiro registro internacional que ajudou o seu nome ganhar prestigio, foi o da horda Lord Belial. É possível dizer que esse registro foi um divisor de aguas na sua carreira e você tem preferência para fazer trabalho para bandas de Metal Extremo?
Marcelo Vasco: Sim, é verdade. Eu acredito que o Lord Belial tenha sido o pontapé inicial na minha vida profissional como artista gráfico. Antes deles eu já trabalhava “profissionalmente” com isso, fazendo artes para bandas brasileiras e ajudando bandas de amigos, mas era algo ainda super reduzido e sem muita expressão. O Lord Belial, por ser uma banda internacional e ter um selo maior por trás, fazendo todo um trabalho mais expansivo de publicidade, acabou dando mais visibilidade pro meu trabalho e gerando mais clientes do Brasil e de fora. Ainda não era meu ganha pão, mas foi sem dúvida um divisor de águas importante pro começo da minha carreira. Olha, não digo que seja exatamente uma preferência, foi tudo muito natural. E claro, as capas de Heavy Metal e Metal extremo foram sempre as que me causaram um maior impacto visual. Sou fã de Metal desde moleque e isso corre nas veias, então com certeza é pelo o que meu coração bate mais forte (risos). Mas ao mesmo tempo gostaria de fazer outras coisas no mundo da música, não só Metal extremo. O lance é que as pessoas geralmente me procuram pelas referências do trabalho que eles veem eu fazer. Raramente outro tipo de banda se interessa pelo meu trabalho, talvez até imaginando que eu não me encaixe no contexto delas, por estar sempre fazendo coisas muito mais “sangrentas” e “brutais”, digamos assim (risos). Eu já trabalhei para bandas de Pop e Rock, mas é algo muito raro de acontecer.
Quando você é contratado por uma banda para fazer a capa você pede acesso as músicas, a temática do álbum ou prefere não ser influenciado pela obra em si?
Marcelo Vasco: Nem sempre o disco está pronto quando eu começo o processo de criação da capa, então as vezes eu acabo não tendo chance de ouví-lo antes. Mas com certeza toda essa conexão com o trabalho como um todo, é super importante pra mim. Quando possível, gosto de ouvir as músicas, de ler as letras e me aprofundar mais naquele universo. É primordial para que eu consiga captar a essência do trabalho e passar aquilo tudo pro “papel”. Mas geralmente o ponto inicial vem de um conceito passado pela banda, ideias, referências ou baseado no título do álbum. Com isso eu já consigo começar a trabalhar, mesmo se não tenho acesso as letras e a música.
Você como artista tem uma criatividade nata, entretanto muitas bandas não querem abrir mão dos pentagramas, diabos e cruzes, (não que não curtimos isso, rs) porém é difícil fugir de um padrão, isso te incomoda de alguma forma?
Marcelo Vasco: As vezes incomoda sim (risos). É o lado negativo do trabalho, pois é difícil não se repetir usando sempre as mesmas temáticas e elementos nas capas. E quando envolve criatividade, isso acaba sendo um enorme muro na minha frente. Eu me esforço de uma maneira absurda pra tentar me reinventar, mesmo estando trabalhando por tantos anos nesse mesmo universo. Infelizmente o mundo do Metal muitas vezes pode ser limitado e com cabeça fechada. Se eu experimento pensar um pouquinho fora da caixa, a banda já chega cortando e me pedindo pra enfiar crânios, sangue, cruzes e demônios (risos). Como tu disse, não é que eu não goste, faz parte do pacote… Mas tem horas que realmente a coisa acaba ficando monótona demais e eu perco a paciência. Por sorte hoje em dia, principalmente estando sempre com a agenda lotada, tenho a possibilidade de escolher os trabalhos que quero fazer. Isso já ajuda um pouco…
Não poderíamos deixar de falar de Slayer, que é um dos pontos altos da sua carreira. Você poderia descrever como foi a sensação de estar fazendo a capa para uma banda que sem dúvida, deves ter ouvido muito na sua adolescência? E os caras são cristãos declarados eles não ficaram meio incomodados com a arte.
Marcelo Vasco: O Slayer foi a realização de um sonho que eu nunca imaginei ser possível. Eu ter assinado a arte de capa pra eles foi surreal demais pra mim. Eles sempre foram a minha banda preferida de todos os tempos, então este feito foi uma conquista não só profissional, mas também super pessoal. Nada está além disso pra mim! Pura emoção (risos). A questão da capa, nem um pouco. Imagina… Trabalhei nela junto com eles e era exatamente o que eles estavam procurando. Agressividade no seu nível máximo! Eles me deixaram livres pra criar, e houveram outras propostas de capas minhas, além dessa que foi a escolhida. Então cada detalhe está ali por um motivo. Tudo foi dirigido e aprovado pelo Tom Araya e Kerry King. O próprio Tom foi um dos que ficou mais empolgados com o resultado da capa (risos). Além disso, existe muita falta de informação quando as pessoas dizem que eles são cristãos declarados. Não é exatamente assim… O único que de fato declarou isso foi Tom Araya, dizendo ser católico. Não significa que ele seja um padre que reza missa todos os dias e vá se ofender com meras imagens (risos). No contexto em que ele disse isso, teve referência a uma tradição familiar, respeitando seus pais, filhos, família, acho até que foi ligado a algo mais espiritual, não necessariamente religioso. Ele já deu a entender também que aquilo que ele canta nas músicas do Slayer não seja necessariamente algo que ele prega. O Kerry King e os outros já não atendem a isso, claramente. Kerry foi sempre super anti-religião e é até hoje, pelas entrevistas que se vê dele por ai. O lance é que o Slayer é uma entidade viva, que funciona independente da vida pessoal dos seus integrantes. Está muito além disso… O que eles fazem é arte, eles são artistas, e profissionais…. Sabem muitíssimo bem separar as coisas quando é preciso. Você falar sobre um assunto não significa que você seja parte do assunto ou defenda lados, isso é algo que muita gente não consegue compreender. É como aquelas pessoas que insultam atores na rua por papéis de vilão que fazem. Simplesmente não faz sentido, é risível (risos). No final das contas, tanto na música como na arte em geral, a subjetividade está por toda parte, e essa é a beleza, na minha opinião.
Sei que é uma pergunta difícil, mas além do Slayer que arte sua você indicaria para quem ainda não conhece Marcelo Vasco? Eu por exemplo tenho como minhas favoritas a do Rebaelliun e do Dark Funeral. Aliás, parabéns por essas capas em especial.
Marcelo Vasco: Obrigado! Pois é, realmente difícil dizer… Mas gosto muito da capa do Borknagar “Winter Thrice”, acho que é uma das minhas favoritas. Também gosto da capa do Soulfly “Enslaved”, do Vintersorg “Till Fjäls II” e por ai vai. Eu tenho uma tendência de ser muito autocrítico e acabo odiando tudo que eu faço, depois de um tempo (risos). Essas são capas que eu ainda consigo olhar sem me causar calafrios, digamos assim.
Agora uma reclamação de fã. Não tivemos show do Patria esse ano. Depois de terem lançado trabalhos maravilhosos, a vontade de ver vocês ao vivo só aumenta, teremos uma agenda do Patria em 2019?
Marcelo Vasco: É verdade! E não foi por falta de vontade… É que as coisas estão indo de mal a pior aqui no Brasil. Os produtores não dão valor ou investem nas bandas, já que o público tem sido cada vez menor também. E não somos uma banda que toca toda hora. Estamos “isolados” aqui na Serra Gaúcha, longe de todo o resto do Brasil, o que gera um custo mais alto, quando querem nos contratar para shows. Enfim, esse ano foi nulo e acho que esse cenário não vai mudar, visto que já estamos em Outubro. Bom, espero que em 2019 as coisas melhorem, mas infelizmente ainda não temos nada na agenda. Mas muito obrigado pelas palavras e pela vontade em nos ver ao vivo :). Queremos muito tocar mais, mas os produtores precisam entender que a coisa precisa ser feita da maneira correta e profissional. Não é zona e nem tocamos por cerveja! Infelizmente dá pra contar nos dedos as pessoas que pensam profissionalmente aqui no Brasil, no meio do Metal Extremo. Nosso país precisa comer muito feijão com arroz pra coisa andar (risos). E não pense que não fico super triste de dizer isso…
Em nosso site temos uma coluna ”de músico para músico” inspirado nessa coluna gostaria de saber quais conselhos você poderia dar para quem pretende seguir a carreira de designer gráfico voltado para o Heavy Metal.
Marcelo Vasco: Meu conselho é estudar bastante, pesquisar, se envolver, se dedicar por completo. É um vida difícil, principalmente no começo, então acho que a pessoa precisa estar muito bem preparada. Algo de suma importância é ter muita paciência, não querer colocar a carroça na frente dos bois. Vejo muita gente com esse tipo de pensamento e atitude. Se profissionalizar é importante obviamente, mas cada coisa no seu lugar. Assuma o lugar de estudante, de apreciador, não tem mal nenhum isso. Treine bastante, faça por hobby se necessário, todos esses passos são essenciais para o desenvolvimento de um trabalho sério, e com o mercado da maneira que está, tu precisa ser o melhor possível naquilo, em todos os âmbitos, não só no trabalho prático. Valorize-se de acordo com a sua experiência e qualidade gráfica, construa um network e saiba escolher os projetos certos. Com tudo isso sendo trabalhado junto, as chances da coisa funcionar sem dúvida são maiores.
Obrigado pela Entrevista Marcelo Vasco, gostaria de deixar algum recado para os Leitores do Subsolo?
Marcelo Vasco: Eu que agradeço! Valeu pelo papo e pelo espaço aqui. Agradeço de coração todos que leram e se interessaram pela entrevista. Acompanhem o meu trabalho através do meu site www.marcelovasco.com ou Facebook: www.facebook.com/marcelovascoarts. Grande abraço!!!